Tensão Inicial
Trecho do diário de Sofia Alvarez:
“Entrar na sala foi como caminhar por uma linha tênue entre o abismo e a esperança. Victor não estava apenas presente; ele era a própria tensão que preenchia o espaço. Cada palavra minha precisava ser cuidadosa, calculada, mas ainda assim humana. Eu sabia que qualquer passo em falso poderia selar nosso destino.”
A negociação aconteceu em um local neutro — uma sala privada em um luxuoso hotel corporativo no centro da cidade. O ambiente era frio e impessoal, com paredes de vidro que refletiam a luz artificial e uma mesa longa de madeira polida que parecia brilhar excessivamente sob o brilho das lâmpadas embutidas. Apesar da neutralidade do local, o clima era sufocante desde o primeiro momento.
Victor entrou acompanhado de dois seguranças e seu assistente pessoal, Rômulo Salgado. Ele trajava um terno impecável, como sempre, mas havia algo diferente nele. Seus olhos âmbar, antes carregados de confiança e controle, agora pareciam mais afiados, quase predatórios. A paranoia que corroía sua mente transparecia em cada gesto, cada olhar avaliador.
Sofia, Eduardo e Vanessa estavam sentados do outro lado da mesa, suas expressões cuidadosamente controladas para não revelar o nervosismo que sentiam. Eles sabiam que estavam entrando na toca do lobo, mas também sabiam que aquela era sua única chance de tentar mudar o rumo dos acontecimentos.
Assim que Victor se sentou, ele começou a observá-los com uma intensidade desconcertante. Cada movimento, cada palavra trocada, era analisado como se fosse parte de uma conspiração maior. Ele não disse nada por alguns segundos, apenas encarou Sofia, como se tentasse desvendar suas intenções.
— Então… — Victor finalmente falou, sua voz calma, mas carregada de uma ameaça velada. — Você aparece aqui, Sofia, depois de tanto tempo. Com essas… pessoas. O que exatamente vocês querem?
Sofia respirou fundo antes de responder. Ela sabia que as próximas palavras definiriam o tom de toda a conversa.
— Estamos aqui porque acreditamos que há outra maneira, Victor. Uma maneira de usar sua pesquisa para o bem, sem sacrificar princípios éticos.
Victor arqueou uma sobrancelha, um sorriso sarcástico surgindo lentamente em seus lábios.
— Para o bem? — ele repetiu, sua voz gotejando de escárnio. — E quem decide o que é “bom”? Vocês?
Vanessa interveio, sua voz firme, mas cuidadosa.
— Não somos nós. É a ciência. É a humanidade. Sabemos o que você fez nos laboratórios, Victor. As vidas que foram destruídas. Mas também sabemos que essa tecnologia tem potencial para salvar milhões.
Victor inclinou-se para frente, apoiando os cotovelos na mesa. Seus olhos brilhavam com uma mistura de curiosidade e desdém.
— Ah, então vocês estão aqui para me dar lições de moral? Para me dizer como devo usar minha criação?
Eduardo, que até então havia permanecido em silêncio, decidiu falar.
— Não estamos aqui para julgar, Victor. Estamos aqui para propor uma solução. Uma que beneficie todos, não apenas você.
Victor riu, um som baixo e amargo que ecoou pela sala.
— Beneficiar todos ? Que ingenuidade. Vocês realmente acham que o mundo está pronto para algo assim? Que as pessoas merecem isso?
Trecho do diário de Vanessa Mendes:
“Ele nos observava como se fôssemos peças de um jogo que ele já tinha ganho. Mas eu sabia que não podíamos recuar. Aquela era nossa única chance de mostrar que havia outro caminho.”
A tensão na sala era palpável. Victor continuava a questionar cada palavra, cada gesto, como se estivesse desmontando uma armadilha invisível. Ele sabia que aquela reunião não era apenas uma negociação — era uma batalha pelo controle.
— Muito bem — disse Victor, após um longo silêncio. — Digam-me, então. Qual é a sua proposta?
Sofia trocou um rápido olhar com Eduardo e Vanessa antes de começar a explicar. Ela sabia que as próximas palavras poderiam determinar não apenas o futuro da pesquisa, mas o destino de todos eles.
A Proposta da Facção Moderada
Trecho do diário de Sofia Alvarez:
“Não é apenas sobre convencer Victor. É sobre fazer com que ele veja que há outra maneira, uma que não envolva destruição total. Se conseguirmos plantar essa semente, talvez ele enxergue o valor em nossa proposta.”
A sala estava tensa, mas Sofia manteve a compostura. Ela sabia que cada palavra precisava ser cuidadosamente escolhida para não soar como uma ameaça direta, mas sim como uma oportunidade — algo que Victor pudesse ver como vantajoso para seus próprios interesses. Após um breve silêncio, ela começou a falar.
— Sr. Lancellotti, estamos aqui porque acreditamos que existe um caminho diferente para lidar com sua pesquisa. Um caminho que não envolve destruição ou perda irreparável.
Victor ergueu uma sobrancelha, seu olhar penetrante fixo em Sofia. Ele não disse nada, apenas esperou que ela continuasse.
— Sabemos que a tecnologia regenerativa tem potencial para transformar o mundo — para salvar vidas, curar doenças e melhorar a qualidade de vida de milhões. Mas também entendemos os riscos. Por isso, estamos propondo algo que beneficie a todos, sem comprometer princípios éticos.
Vanessa interveio, sua voz firme, mas respeitosa.
— O que estamos sugerindo é a criação de um comitê global independente para supervisionar o uso dessa tecnologia. Esse comitê garantiria transparência, igualdade no acesso aos tratamentos e a implementação de regulamentações rigorosas para evitar abusos.
Eduardo acrescentou, enfatizando o aspecto prático da proposta.
— Não estamos pedindo que você abandone seu trabalho ou renuncie ao controle total. Estamos oferecendo uma solução que pode proteger seu legado enquanto assegura que sua pesquisa seja usada para o bem maior.
Sofia observou Victor atentamente, tentando captar qualquer mudança em sua expressão. Ele parecia intrigado, mas ainda desconfiado.
— E por que eu deveria confiar em vocês? — Victor finalmente falou, sua voz calma, mas carregada de ceticismo. — Como sei que não são apenas uma extensão dos radicais que querem destruir tudo o que construí?
Trecho do diário de Eduardo Cardoso:
“Sabíamos que essa seria a pergunta mais difícil. Para ganhar a confiança de Victor, precisávamos deixar claro que não estávamos aliados à facção radical. Mas, ao mesmo tempo, tínhamos que ser convincentes o suficiente para que ele visse valor em nossa proposta.”
Sofia respirou fundo antes de responder.
— Nós não estamos aqui para destruir, Sr. Lancellotti. A facção liderada por Clara Cardoso deseja acabar com tudo — os laboratórios, as pesquisas, o conhecimento acumulado. Nós… nós acreditamos que há outro caminho. Um que preserva o progresso sem sacrificar a moralidade.
Ela fez uma pausa, escolhendo as próximas palavras com cuidado.
— Além disso, trouxemos provas das atrocidades cometidas em seus laboratórios. Provas que poderiam causar danos irreparáveis à sua reputação se fossem divulgadas. Mas estamos dispostos a negociar. Em troca de sua cooperação, essas informações permanecerão confidenciais.
Victor inclinou-se para trás em sua cadeira, seus dedos tamborilando lentamente na mesa. Ele parecia estar avaliando as palavras de Sofia, mas havia algo em sua expressão que sugeria que ele ainda não estava convencido.
— Um comitê global… — ele repetiu, como se testasse a ideia. — Supervisão internacional, transparência… Parece-me uma utopia ingênua. Quem garante que esse comitê não será corrompido? Ou que governos não usarão isso para manipular a tecnologia para seus próprios fins?
Vanessa interveio novamente, tentando aliviar as preocupações de Victor.
— Entendemos suas reservas, mas a alternativa é muito pior. Se a tecnologia continuar nas sombras, sem supervisão, o risco de abuso só aumentará. E, como você sabe, há pessoas lá fora que já estão movendo peças para expor tudo. Esta é sua chance de controlar a narrativa, de moldar o futuro de acordo com seus termos.
Victor permaneceu em silêncio por alguns momentos, seus olhos âmbar fixos nos moderados. Ele parecia estar ponderando, calculando os prós e contras da proposta.
Trecho do diário de Vanessa Mendes:
“Ele estava pensando. Pela primeira vez, senti que talvez estivéssemos chegando a algum lugar. Mas, ao mesmo tempo, sabíamos que Victor não era homem de tomar decisões impulsivas. Ele precisava de mais.”
Finalmente, Victor falou, sua voz suave, mas carregada de intenção.
— Interessante… Vocês apresentaram uma proposta que, pelo menos em teoria, parece benéfica para todos. Mas ainda há muitas variáveis. Preciso de mais detalhes. Mais garantias.
Sofia assentiu, percebendo que aquela era sua chance de avançar.
— Claro, Sr. Lancellotti. Estamos preparados para fornecer todas as informações que você precisa. Só pedimos que considere seriamente nossa oferta.
Victor sorriu levemente, um gesto que não transmitia confiança, mas sim um misto de curiosidade e cautela.
— Muito bem. Continuemos então.
A Paranóia do Bilionário
Trecho do diário de Victor Lancellotti:
“Eles pensam que sou um tolo. Que podem vir até mim com suas palavras bonitas e seus planos ‘éticos’ e me fazer acreditar que estão aqui para ajudar. Mas eu vejo através deles. Eles são como todos os outros — apenas mais uma facção querendo tomar o que é meu.”
Victor sempre fora um homem acostumado a controlar cada detalhe de sua vida, cada movimento em seu tabuleiro estratégico. Mas as sabotagens recentes e a exposição pública de suas práticas haviam corroído algo dentro dele. A paranoia, antes apenas uma sombra tênue em sua mente, agora era uma presença constante, sussurrando desconfianças em cada decisão que tomava.
Enquanto ouvia Sofia Alvarez apresentar a proposta dos moderados, Victor mantinha sua expressão cuidadosamente neutra. Ele observava cada gesto, cada palavra, como se estivesse desmontando um relógio para entender seu mecanismo interno. Sua mente trabalhava em alta velocidade, conectando pontos invisíveis para os outros na sala.
— Supervisão global… transparência… acesso universal… — Victor repetiu lentamente, como se saboreasse as palavras. Seus olhos âmbar brilhavam com uma intensidade perturbadora enquanto ele encarava Sofia. — Interessante como vocês escolheram esses termos. Quase como se estivessem tentando me vender uma ideia que já foi rejeitada antes.
Sofia manteve a compostura, mas sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ela sabia que estava pisando em terreno perigoso.
— Sr. Lancellotti, esta não é uma questão de vendas. É uma oportunidade para garantir que sua pesquisa beneficie a humanidade sem comprometer sua integridade.
Victor inclinou-se para trás em sua cadeira, cruzando os dedos sobre o colo. Seu sorriso era frio, quase predatório.
— Beneficiar a humanidade… — ele murmurou, como se testasse o peso das palavras. — Diga-me, Sofia, quem exatamente está por trás dessa “proposta”? Você? Eduardo Cardoso? Vanessa Mendes? Ou será que há alguém mais… influente no comando?
Vanessa trocou um olhar rápido com Eduardo, mas ambos permaneceram em silêncio. Victor percebeu o gesto e anotou mentalmente.
Trecho do diário de Victor:
“Eles pensam que podem me enganar. Eduardo e Vanessa mencionaram Clara Cardoso como se fosse uma ameaça distante, mas sei que ela está por trás disso. Essa facção moderada não passa de um braço da resistência maior. Eles querem me enfraquecer antes de atacar.”
Victor continuou falando, sua voz suave, mas carregada de uma ameaça velada.
— Vocês falam de supervisão internacional, de transparência… mas tudo isso requer confiança. E, francamente, não confio em vocês. Nem em suas intenções.
Sofia tentou argumentar, mas Victor ergueu a mão, interrompendo-a.
— Não, deixe-me terminar. Vocês vieram até mim com essa proposta porque sabem que não podem derrotar minha pesquisa pela força. Então, tentam me manipular. Tentam me convencer de que há outro caminho. Mas eu conheço bem esse jogo.
Ele se levantou lentamente, caminhando até a janela que dominava a sala. As luzes da cidade refletiam em seus olhos, transformando-os em poços de escuridão.
— Vocês acham que sou ingênuo. Acham que não sei o que está acontecendo lá fora. Os protestos, as sabotagens, as tentativas de expor minha empresa… Tudo isso é parte de um plano maior. E agora vocês estão aqui, tentando me oferecer uma saída honrosa.
Victor virou-se abruptamente, seus olhos faiscando com uma mistura de raiva e paranoia.
— Mas eu não preciso de saídas honrosas. Eu sou Victor Lancellotti. Eu construí este império com minhas próprias mãos, e ninguém vai tirá-lo de mim.
Trecho do diário de Victor:
“Eles subestimaram minha determinação. Pensaram que poderiam usar palavras para me dobrar. Mas eu sei o que eles realmente são: traidores. E traidores devem ser eliminados.”
Victor voltou à mesa, apoiando as mãos firmemente sobre a superfície polida.
— Vocês têm coragem, admito isso. Mas coragem não é suficiente. Vou lhes dar uma chance de sair desta sala vivos. Voltem para onde vieram e digam a Clara Cardoso que ela perdeu. Minha pesquisa continuará, e nada do que ela ou qualquer um de vocês fizer vai mudar isso.
O clima na sala ficou tenso, como se o ar tivesse sido sugado para fora dela. Sofia sabia que tinham perdido a batalha verbal, mas ainda havia algo mais por vir. Victor não era homem de simplesmente deixar as coisas por isso mesmo.
Trecho do diário de Vanessa Mendes:
“Eu vi isso nos olhos dele. Aquela faísca de insanidade que transforma homens em monstros. Sabíamos que ele não aceitaria nossa proposta, mas não esperávamos que reagisse tão rapidamente.”
Assim que a reunião terminou, Victor chamou Rômulo Salgado ao seu escritório.
— Descubra tudo o que puder sobre essa facção moderada. Eles não estão agindo sozinhos. Há algo maior por trás disso. E prepare nossos recursos. Não podemos permitir que eles continuem existindo.
Rômulo assentiu, mas havia um leve tremor em suas mãos. Ele sabia que Victor estava prestes a cruzar um limite do qual não haveria retorno.
Trecho do diário de Victor:
“Eles queriam me dividir. Me enfraquecer. Mas só provaram que sou mais forte do que qualquer conspiração. Agora, vou mostrar a eles o verdadeiro custo de desafiar Victor Lancellotti.”
A paranóia de Victor havia vencido. O que começou como uma tentativa de negociação pacífica transformou-se, em sua mente, em uma conspiração para destruir tudo o que ele construiu. E ele não hesitaria em eliminar qualquer ameaça — real ou imaginária.