O Preço da Eterniade, Capítulo 22: A Reação do Movimento

Clara enfrenta a traição de aliados que tentaram negociar com Victor. Furiosa, ela exige lealdade e prepara o grupo para um confronto decisivo.

Cardoso e a Fúria Temporária

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Quando soube o que eles fizeram, senti algo dentro de mim se romper. Não era apenas raiva; era uma sensação de traição tão profunda que me fez questionar tudo em que acreditava. Eles não entenderam que não há meio-termo com Victor. Ele não negocia — ele destrói.”

Clara estava sozinha no galpão quando recebeu os primeiros relatórios. Informantes espalhados pela cidade haviam visto Sofia, Eduardo e Vanessa sendo libertados por Victor. Mas isso não era tudo. Os detalhes eram piores do que ela poderia imaginar.

— Eles tentaram negociar com Victor — disse Marcos, entrando na sala com um tablet nas mãos, seus olhos refletindo preocupação.

Clara ergueu os olhos para ele, sua expressão endurecendo como pedra.

— Negociar? — repetiu ela, sua voz baixa, mas carregada de incredulidade. — Eles realmente acharam que Victor abriria mão de seu controle? Que ele aceitaria condições éticas?

Marcos hesitou antes de responder.

— Parece que sim. Eles acreditavam que havia outra saída. Uma maneira de usar a pesquisa para o bem sem destruir tudo.

Clara levantou-se abruptamente, suas mãos cerradas em punhos. Ela começou a andar de um lado para o outro, sua energia irradiando frustração e raiva.

— Outra saída? — ecoou ela, sua voz subindo de tom. — Victor não oferece saídas. Ele oferece armadilhas. Eles colocaram todo o movimento em risco!

Marcos observou-a em silêncio, sabendo que qualquer palavra poderia piorar a situação.

— O que vamos fazer? — perguntou ele, cautelosamente.

Clara parou de andar e encarou Marcos, seus olhos faiscando de determinação.

— Vamos esperar até que voltem. E então, eu vou deixar uma coisa muito clara: essa traição não ficará impune.

Trecho do diário de Marcos:

“Vi Clara furiosa antes, mas nunca assim. Havia algo diferente em sua postura, como se cada palavra que dizia fosse uma faca cortando o ar. Ela não estava apenas brava — estava devastada.”

Enquanto isso, fora do galpão, Sofia, Eduardo e Vanessa avançavam rapidamente em direção à base do movimento. Cada um carregava consigo o peso do que havia acontecido nas últimas horas. Ainda assim, antes que pudessem sequer chegar ao local, Clara já havia tomado sua decisão.

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Não posso confiar neles agora. Não depois disso. Eles colocaram em risco tudo pelo que lutamos. Mas sei que essa fúria que sinto… ela não é apenas por eles. É por mim. Porque, por um momento, eu também quis acreditar que havia outra saída.”

A tensão no ar era palpável. Os membros do movimento que assistiam à cena em silêncio começaram a murmurar entre si, divididos entre apoiar Clara ou questionar sua dureza. Mas, por enquanto, ninguém ousou desafiá-la.

Enquanto isso, Clara sabia que precisava agir rápido. Victor não perderia tempo em usar essa oportunidade para atacar. Ela precisava proteger o movimento, mesmo que isso significasse tomar decisões impopulares.

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Agora, mais do que nunca, preciso ser forte. Preciso liderar. Mesmo que isso signifique afastar aqueles que um dia considerei aliados.”

Culpa e Reconquista de Confiança

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Eles voltaram. E com eles, uma sombra de Victor pairando sobre o galpão. Ele não os libertou por bondade — isso eu sabia. Mas o que me consumia era a dúvida: até onde Victor havia infiltrado suas mãos em nossa resistência?”

O som de passos ecoava pelo galpão quando Sofia, Eduardo e Vanessa entraram, exaustos e visivelmente abalados. Seus rostos estavam marcados pela tensão dos últimos dias, mas algo mais pesava no ar. Clara observava-os de longe, sua postura rígida como aço enquanto avaliava cada movimento. Ela já sabia que algo estava errado antes mesmo deles falarem. Informantes haviam relatado a liberação estranha e abrupta, e agora, ao vê-los, ela percebeu sinais sutis de algo que não deveria estar ali.

— Vocês estão sendo rastreados — disse Clara, sua voz fria e direta, cortando o silêncio antes que qualquer um pudesse pronunciar uma palavra de explicação.

Vanessa hesitou, trocando um olhar rápido com Eduardo. Sofia, por outro lado, manteve o olhar firme, embora suas mãos tremessem levemente.

— Como…? — começou Vanessa, mas Clara ergueu a mão, interrompendo-a.

— Não me subestimem. Eu sei como Victor pensa. Ele não solta ninguém sem um propósito. Agora, mostrem-me onde estão os dispositivos.

Os três entreolharam-se novamente, e Sofia finalmente abaixou a cabeça, derrotada.

— Ele nos usou — admitiu ela, sua voz quase um sussurro. — Antes de nos libertar, implantou dispositivos de rastreamento. Tentamos entender o plano dele, mas…

Clara avançou alguns passos, seus olhos faiscando com uma mistura de raiva e desapontamento.

— Tentaram? — repetiu ela, sua voz subindo de tom. — Vocês não apenas tentaram; vocês entregaram informações valiosas para ele. Vocês se expuseram, colocaram todos nós em risco.

Eduardo finalmente encontrou coragem para falar, sua voz firme apesar da culpa evidente.

— Nós fizemos o que achávamos certo, Clara. Acreditávamos que havia outra saída. Uma maneira de evitar mais violência, mais perdas. Não podíamos simplesmente aceitar que tudo seria destruído sem tentar algo diferente.

Clara balançou a cabeça, frustrada.

— Diferente? Vocês chamam isso de diferente? Ir até Victor, negociar com ele, como se ele fosse algum tipo de figura racional? Ele não é um homem que aceita compromissos. Ele é um predador. E agora, por causa dessa ingenuidade, ele está mais perto de nós do que nunca.

Vanessa deu um passo à frente, sua expressão implorando compreensão.

— Nós sabemos que cometemos um erro, Clara. Um grande erro. Mas não foi por malícia. Foi por esperança. Por acreditar que ainda há espaço para algo bom nisso tudo.

Trecho do diário de Vanessa Mendes:

“Eu vi a decepção nos olhos de Clara. Era como se ela estivesse olhando para estranhos, não para pessoas que já haviam lutado ao seu lado. Mas também vi algo mais: uma centelha de entendimento. Ela sabia que nossas intenções não eram más, mesmo que nossas ações tivessem sido desastrosas.”

Clara respirou fundo, tentando controlar a tempestade de emoções dentro dela. Ela sabia que precisava ser pragmática, não emocional. O movimento não podia se dar ao luxo de perder aliados, especialmente agora, quando o confronto final se aproximava.

— Vocês querem redenção? — perguntou ela, sua voz mais calma, mas ainda carregada de autoridade. — Então provem que ainda são úteis. Removam esses dispositivos e garantam que Victor não tenha acesso a mais nada.

Sofia assentiu rapidamente, aliviada por Clara não ter decidido excluí-los imediatamente.

— Faremos isso. E qualquer outra coisa que precisar.

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Não posso confiar neles completamente, não agora. Mas também não posso afastá-los. Preciso de cada braço, cada mente, se quisermos enfrentar Victor. Eles têm algo que eu não tenho: a crença de que ainda há luz no que ele criou. Talvez essa luz seja útil. Ou talvez seja outra armadilha. Só o tempo dirá.”

Marcos, que até então havia permanecido em silêncio, aproximou-se com um scanner portátil.

— Deixem-me verificar onde estão os dispositivos. Victor não é descuidado. Ele os colocaria em lugares difíceis de remover.

Enquanto Marcos trabalhava, Clara encarou os três moderados, sua expressão dura como pedra.

— Isso não significa que estamos em paz. Vocês traíram a causa ao agir pelas costas do movimento. A confiança precisa ser reconquistada. E isso não será fácil.

Eduardo assentiu, sua voz firme, mas humilde.

— Entendemos, Clara. E aceitamos as consequências. Mas saiba que ainda acreditamos que há outro caminho. Um que preserve o conhecimento sem sacrificar nossos princípios.

Clara não respondeu imediatamente. Ela sabia que a divisão ideológica entre eles ainda era profunda. Para ela, a destruição total da pesquisa de Victor era a única forma de garantir que ele não continuasse a manipular o mundo. Mas também sabia que os moderados tinham um ponto: a tecnologia, nas mãos certas, poderia salvar vidas.

— Continuem defendendo suas ideias — disse ela finalmente, sua voz suave, mas firme. — Mas lembrem-se disto: enquanto Victor existir, não haverá meio-termo. Ele não vai parar até que todos nós estejamos mortos ou sob seu controle.

Trecho do diário de Eduardo Cardoso:

“Clara não nos perdoou. Nem esperávamos que ela o fizesse. Mas ela nos deu uma chance. Uma chance de provar que ainda podemos contribuir, mesmo que nossos métodos sejam diferentes. Isso terá que ser suficiente… por enquanto.”

Marcos finalmente encontrou os dispositivos — pequenos implantes localizados na base do pescoço de cada um. Com cuidado, ele os removeu, colocando-os em um recipiente isolado.

— Pronto — disse ele, sua voz séria. — Mas isso não garante que Victor não tenha outros planos. Ele pode estar usando vocês como isca.

Clara cruzou os braços, seu olhar fixo nos moderados.

— Então vamos transformar isso em uma vantagem. Victor acha que nos dividiu, que nos enfraqueceu. Vamos mostrar a ele que está errado.

Trecho do diário de Clara Cardoso:

“Victor pensa que pode nos usar uns contra os outros. Que pode nos dividir e nos destruir. Mas ele subestima algo que nunca entendeu: a força de pessoas unidas por um propósito maior do que elas mesmas. Mesmo que estejamos feridos, mesmo que desconfiemos uns dos outros, ainda somos um movimento. E isso é algo que ele nunca poderá quebrar.”