Cateline abriu a carta com mãos trêmulas, enquanto Dimitri permanecia ao seu lado, tentando parecer mais confiante do que realmente estava. A escrita na página era irregular, como se as palavras tivessem sido gravadas com pressa ou raiva:
“Para quebrar o ciclo de podridão que consome Plockton, serão necessárias três coisas:
- Uma oferenda vinda do coração,
- Uma chama que queima o passado,
- Uma palavra dita com verdade.”
Cateline leu as palavras em voz alta, mas a confusão no rosto dela espelhava a de Dimitri. “O que isso quer dizer?” ela perguntou, olhando para ele como se esperasse que o padre tivesse respostas.
Dimitri balançou a cabeça, a expressão sombria. “Não sei. É vago de propósito, como tudo o que Elara faz.”
Quando os dois se viraram para discutir o significado da carta, perceberam algo estranho. A cabana onde haviam estado momentos antes estava desaparecendo, como se fosse feita de fumaça, dissolvendo-se no ar. Cateline sentiu um nó no estômago.
“Claro,” murmurou ela com amargura. “Agora estamos sozinhos.”
Antes que pudessem reagir, a voz de Elara ecoou ao redor deles, embora não pudessem vê-la. “Sozinhos? Vocês não são exatamente brilhantes, são?” Ela riu, um som cortante e zombeteiro. “O tabuleiro mudou, mas as peças ainda estão aqui. A questão é: vocês conseguem jogar?”
Cateline apertou os punhos. “Por que você faz isso? Por que simplesmente não resolve tudo de uma vez?”
Elara suspirou dramaticamente. “Porque isso não seria divertido, minha cara. Vocês precisam merecer a solução. E, francamente, quero ver até onde podem ir antes de desistirem.”
A presença dela sumiu novamente, deixando apenas o silêncio. Dimitri suspirou, os ombros tensos. “Ela quer que descubramos sozinhos. Não podemos perder mais tempo.”
Cateline cruzou os braços, a dúvida e o ressentimento ainda evidentes. “E se eu não quiser? Por que deveria salvar um lugar que me destruiu?”
Dimitri olhou para ela, a determinação finalmente brilhando em seus olhos. “Não por eles. Não por aqueles que ignoraram sua dor. Mas pelas crianças. Pelos inocentes que ainda podem ter um futuro. Você pode viver sabendo que teve a chance de mudar algo e escolheu não fazer nada?”
As palavras dele a atingiram como um golpe, mas Cateline não respondeu de imediato. Depois de um longo momento, ela suspirou e assentiu. “Por mim mesma. Nada mais.”
A Biblioteca Intacta
Guiados por um impulso que nenhum dos dois compreendia completamente, Cateline e Dimitri foram até o antigo prédio da biblioteca de Plockton. Milagrosamente, estava intacta, como se fosse protegida por uma força invisível.
“É claro,” disse Cateline com sarcasmo. “Mais uma peça no jogo.”
Eles vasculharam as prateleiras empoeiradas, buscando qualquer pista que pudesse esclarecer as instruções da carta. Dimitri encontrou um livro sobre rituais antigos, enquanto Cateline localizou um diário de alguém que parecia ter estudado magia em Plockton muito antes da chegada de Elara.
As pistas começaram a se encaixar, mas as respostas não vinham facilmente. Cada página lida os deixava com mais perguntas, e a tensão entre eles crescia.
“Uma oferenda do coração,” murmurou Dimitri. “Isso poderia ser qualquer coisa.”
Cateline olhou para ele, exasperada. “Ou tudo. E se errarmos? E se… tudo isso for inútil?”
Dimitri ergueu os olhos do livro. “Então não vamos errar. Precisamos tentar.”
O Momento Crítico
Quando se preparavam para iniciar o ritual, perceberam que cada um deles precisaria enfrentar o que mais temiam. As palavras da carta começaram a fazer sentido conforme suas fraquezas se tornavam parte do processo.
“Uma oferenda vinda do coração,” disse Dimitri, sua voz baixa. “É mais do que um objeto. Deve ser algo que carregamos dentro de nós, algo que nos define.”
Cateline suspirou, lutando contra o aperto no peito. “A chama que queima o passado… significa deixar ir.” Ela olhou para Dimitri, os olhos cheios de dor. “Eu não sei se consigo.”
“Você consegue,” disse ele, com uma firmeza que parecia surpreender até a si mesmo. “Nós conseguimos.”
Elara apareceu novamente, observando de longe enquanto os dois se preparavam. “Tão sérios,” ela zombou, os olhos brilhando. “Será que conseguirão superar suas próprias barreiras? Ou acabarão consumidos pelo próprio fracasso? Vamos ver.”
Cateline respirou fundo, encarando Dimitri. “Vamos fazer isso. Pelos inocentes. Por nós mesmos.”
Conclusão na Biblioteca
Na biblioteca, enquanto completavam os cânticos e seguiam as pistas dos livros, Dimitri fez sua oferenda: a Bíblia que ele carregara desde os primeiros dias como padre. Cateline acendeu a chama com algo que guardava há anos: uma carta que nunca enviou aos pais falecidos, cheia de mágoa e despedidas.
As palavras finais do ritual foram ditas em uníssono. “Que a verdade nos liberte.”
Uma luz intensa preencheu a sala, e a presença de Elara desapareceu completamente. Plockton aguardava seu destino.